quarta-feira, 19 de maio de 2010

Paisagem Natural: Serra do Marão






A Serra do Marão é uma formação montanhosa de origem xistosa e granítica, de formas abruptas, que atinge no seu ponto mais alto - a Senhora da Serra - os 1 415 metros. Distribuída pelo território dos distritos do Porto e Vila Real, faz a separação entre o Douro Litoral e Trás-os-Montes e constituiu, durante muitos anos, uma barreira difícil de transpor e que muito condicionou a mobilidade dos que moravam "para lá do Marão" (Trás-os-Montes). Hoje, é rasgada de poente para nascente pelo I.P.4 (Itinerário Principal nr. 4) que a aproxima do litoral português e de Espanha.

Integrando a cadeia montanhosa que se prolonga pelo Alvão, a Serra do Marão tem uma área aproximada de 20.000 hectares, 75% dos quais constitui terreno baldio que se espalha pelos concelhos de Amarante, Baião, Vila Real, Mesão Frio, Santa Marta de Penaguião e Régua.
"Bem alto é o Marão e não dá palha nem grão", diz o aforismo popular. Não dá, de facto, sobretudo a partir da quota dos 300 metros, mas a serra apresentou já enorme riqueza florestal, em boa parte dizimada por um violento incêndio ocorrido em Setembro de 1985. Ao todo, arderam então 3.000 hectares de floresta e mato (uma área equivalente a 300 campos de futebol!).

O que ardeu na serra do Marão foram, sobretudo, grandes manchas de pinheiro bravo, resultantes da florestação efectuada a partir dos anos 30, muitas vezes de "armas em punho", para quebrar a resistência das populações serranas que receavam pela perda das pastagens. Nessa altura a florestação era feita por sementeira, gastando-se 50 quilos de penisco por hectare, de que resultavam manchas espessas e bastas, mas muito expostas em caso de incêndio pela matéria combustível que forneciam. A opção, quase única, pelo pinheiro, sendo considerada boa em termos económicos por causa da madeira e porque se trata de uma espécie pouco exigente quanto à natureza dos solos, e muito resistente aos ventos, revelar-se-ia desajustada noutros aspectos.
Depois do incêndio de Setembro de 1985, e quando se pensou na reflorestação da serra, logo se concluiu pela necessidade de adopção de uma filosofia diferente, numa tentativa de levar a floresta a criar as suas próprias defesas.
O renascer do Marão começou em 1988/89, com a implementação do Plano de Acção Florestal, no qual foram gastos de 355.000 contos, tendo como área de intervenção 2.694 hectares, para onde foram elaborados 6 projectos distintos, o de menor dimensão com 143 hectares e o maior com 798 hectares. Os projectos para os cerca de 3.000 hectares a florestar tiveram sempre em conta a existência de linhas de água e toda a acção assentou nas respectivas bacias hidrográficas, donde se partiu, decorrendo os trabalhos entre as quotas dos 400 e dos 800 metros. Para baixo existem as aldeias serranas e, para cima, as chamadas zonas de protecção onde se faz a gestão dos matos e existem precipitações ocultas que propiciam excelentes pastagens de Verão. É também nas quotas mais altas que se procede à criação de "mosaicos" com fogos controlados de Inverno.

Em 1993, a serra do Marão tinha já recebido 4,5 milhões de novas árvores segundo concepções inovadoras e depois de ponderados factores como a natureza dos solos, a altitude ou a penetração dos ventos. A maioria delas são folhosas, como o carvalho e o castanheiro, embora as resinosas, casos dos pinheiros bravo ou larício (conforme a altitude) tenham também uma presença significativa.

A opção pela predominância das folhosas visa dar à serra a possibilidade de criar as suas próprias defesas, prevenindo a propagação dos incêndios. É que, no Verão, as folhosas impedem a existência de fotossíntese ao nível do solo (as folhas impedem a passagem dos raios solares), obstando ao crescimento dos matos. De Inverno, com o cair das folhas, a fotossíntese proporciona o aparecimento de ervas. Não existindo matos, é muito difícil o alastramento dos fogos.

As plantações visaram, também, numa perspectiva genérica, repor o equilíbrio ecológico da serra, razão porque se recorreu a espécies diversificadas, ora criando manchas de uma só, ora misturando várias. E porque o equilíbrio passa ainda pelo regresso das espécies animais, procurou-se também recriar habitats e restabelecer as tradicionais cadeias alimentares. E se não há já muitas esperanças de que as corças voltem a povoar consideravelmente a serra (embora ainda lá existam alguns exemplares), é possível criar condições para que volte a caça e, sobretudo, as aves se "sintam em casa". Nesse sentido foi feito também o plantio abundante de produtores de baga, como o medronheiro, o zimbro, o azevinho ou a cerejeira brava.

Mas, até que as árvores plantadas atinjam a idade adulta vão passar-se muitos anos. Para se ter uma ideia, basta dizer que o corte final, no que se refere a pinhal, está previsto para o ano de 2039 e o de soutos para 2139!

A reflorestação a que se procedeu no Marão, e que urge preservar, foi feita numa perspectiva multidisciplinar, que incluía o estudo e investigação, mas que visava também preparar a serra para o "embate" da abertura da auto-estrada Porto/Amarante, pensando-a, estrategicamente, como o (futuro) grande pulmão da Área Metropolitana do Porto, onde vive mais de um milhão e meio de pessoas. E foi assim que se abriram estradas a cotas diversas, se criaram miradouros e zonas de merendas, com água e "cozinhas" de montanha.
O estabelecimento de pontos de água na serra tem sido uma preocupação dos municípios por onde o seu território se estende, de forma a que, em caso de novo incêndio, se possam abastecer helicópteros e autotanques. Assim, aproveitando linhas de água, criaram-se pequenas barragens cujas albufeiras permitem também zonas de lazer e banhos, funcionando ainda, em alguns casos, como "viveiros" de trutas, peixe que encontra nas águas da serra óptimos habitats.

As partes mais altas do Marão nunca permitiram a fixação de população, mas nas suas faldas cresceram muitas aldeias, cujos habitantes procuravam "nas alturas" e numa agricultura de minifúndio a sua subsistência. A serra proporcionava pasto a imensos rebanhos e dos baldios traziam as populações madeiras e lenhas. Com o 25 de Abril e a entrega da gestão dos terrenos baldios às comunidades, estas aproveitaram as verbas dos cortes de madeira para melhorar a sua qualidade de vida, criar equipamentos e infra-estruturas nas povoações.

Da serra, porém, as povoações não tiravam apenas dividendos com a pastorícia ou as madeiras. Na florestação, que se iniciou em 1916, empregaram-se muitos braços "serranos" e as minas de volfrâmio, que a segunda guerra mundial alimentou, absorveram também, durante vários anos, muita mão-de-obra.

A propósito de baldios, diga-se que a serra do Marão é das que maior área comunitária oferece no país. O baldio de Ansiães (freguesia do concelho de Amarante), por exemplo, tem uma área de 2 500 hectares!

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